Notícias

Sérgio dos Santos Leria, um dos homenageados na celebração dos 50 anos de transplante de fígado, em agosto de 2018, no Teatro da FMUSP, veio a falecer no último dia 4 de dezembro. Ele teve complicações após um retransplante realizado em novembro.

Ativista da causa do transplante por meio da ONG Transpática, atuante no jornal Portal do Ó e destaque do “Guinnes Book” por ser o paciente com mais tempo de sobrevida pós-transplante no mundo, Sérgio foi “profundamente envolvido na causa do transplante e ajudou muitos familiares e transplantados; era uma pessoa muito humanizada”, como define o Prof. Dr. Flavio Henrique Ferreira Galvão, da Disciplina de Transplantes de Órgãos do Aparelho Digestivo, do Departamento de Gastroenterologia, do Hospital das Clínicas da FMUSP.

Dr. Galvão acompanhou Sérgio por aproximadamente sete anos e acabou se tornando seu amigo pessoal. “Fui padrinho de casamento dele e me tornei benemérito da ONG que ele criou para dar apoio a transplantados. O transplante é uma situação a que qualquer um pode estar sujeito. Por isso, precisamos de mais campanhas sobre esse tema e Sérgio foi muito ativo nessa causa. Muitas pessoas não se tornam doadoras por falta de esclarecimentos”, afirma o Prof. Galvão.

Sérgio foi submetido ao seu primeiro transplante em dezembro de 1985, aos 12 anos de idade, por atresia de vias biliares, tendo contado com a expertise da equipe pioneira na área, liderada pelo Prof. Dr Silvano Raia. Devido à rejeição grave, Sérgio precisou ser retransplantado em maio de 1986. Problemas de saúde a partir de 2009 o levaram a um novo retransplante, em novembro de 2018. Essa última cirurgia, de grande dificuldade técnica, levou 15 horas. Mas Sérgio não resistiu, mesmo tendo apresentado boa evolução inicial, segundo o relatório médico divulgado pelo HCFMUSP.

Ex-funcionário da Fundação Faculdade de Medicina (FFM) desde 1998, Sérgio deixa um filho e a esposa. “Não podemos deixar passar em branco a oportunidade de falar da questão do transplante no Brasil. O País possui o maior programa público de transplantes de órgãos, tecidos e células do mundo. Mesmo assim, há um déficit de 30% no índice de doação de órgãos e muita gente morre na lista de espera”, compara o Prof. Galvão.

O Brasil possui o Sistema Nacional de Transplante (SNT), pólos estaduais de transplantes e centros hospitalares de captação de órgãos, além de uma legislação que funciona, segundo o Prof. Galvão. Mas nada disso ajuda a melhorar os índices de doações. Segundo o professor, entre os principais motivos está a falha no processo de captação de órgãos e deficiências nos leitos de UTI que resultam na deterioração de órgãos, além de dificuldades na notificação por morte encefálica. A morte encefálica é de notificação compulsória e precisa ser diagnosticada por um médico com capacitação técnica específica para diagnosticar e notificar o evento.

Porém, a maior barreira ainda é cultural, segundo o Prof. Galvão, pois muitas pessoas ainda não são suficientemente esclarecidas sobre o processo envolvendo a doação e o significado da morte encefálica. “As pessoas ainda são inseguras quanto à idoneidade do programa de doação de órgãos e isso ainda impacta negativamente. É uma pena, pois um doador pode ser capaz de salvar até sete vidas a partir da doação de órgãos”, explica o Prof. Flavio Galvão. 




Equipe do HCFMUSP e Sérgio Leria, nos anos 80.