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Já está disponível em português o e-book Não me toque: Diálogos pós-coloniais sobre a desordem, uma coleção de ensaios orientados pela antropologia médica, escritos pelos pesquisadores e professores do Departamento de Saúde Global e Medicina Social de Harvard, Mary-Jo Good e Byron J. Good. Os textos foram traduzidos pela Profa. Maria de Lourdes Beldi Alcântara, que leciona a Disciplina de Antropologia Médica na Pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), e pelo Prof. Carlos Eduardo Pereira Corbett, do Departamento de Patologia da FMUSP. O lançamento ocorreu em transmissão ao vivo no dia 20 de outubro, com parceria entre as duas universidades.

“Este livro é um marco na discussão da formação médica”, diz a Profa. Maria de Lourdes Beldi Alcântara. Os ensaios reunidos compreendem a medicação de diferentes enfermidades para além dos processos biológicos do corpo humano, estendendo-se também a questões políticas, econômicas, sociais e psicológicas. “É somente por meio da compreensão deste sujeito que carrega um mundo por trás dele que podemos ter eficácia na adesão a um tratamento”, completa a professora.

A tradução é, em parte, uma resposta à hegemonia do saber biomédico vinculado ao mercado farmacêutico, que cerceia o espaço para outras compreensões. O Pós-colonialismo, figura central nos textos, representa a tentativa das ex-colônias de romperem com a visão do colonizador na interpretação de suas próprias culturas, sendo integral para essa nova abordagem. Assim, os dez ensaios reunidos tecem gradualmente histórias locais de trauma e resistência, oriundas de processos nacionais e globais que afetam tanto a experiência coletiva, quanto os indivíduos.

“Neste livro, os autores apresentam vários exemplos que ressaltam desigualdades e ao mesmo tempo a hegemonia da biomedicina”, afirma a Profa. Maria de Lourdes Beldi Alcântara. É o caso do capítulo sobre a epidemia de HIV no Nairóbi, que relata o declínio do setor público de medicina do Quênia sob a perspectiva de médicos residentes, retratando os dilemas éticos trazidos pela falta de recursos e os limites da medicina curativa frente a AIDS. Segundo a professora, a formação médica diante de um mundo cada vez mais desigual "impõe e cria necessidades mundiais que, na grande maioria das vezes, resultam em frustrações tanto dos profissionais médicos, quanto dos pacientes”.

Os ensaios reunidos em Não me toque: Diálogos pós-coloniais sobre a desordem devem atrair diferentes tipos de leitores, desde membros da comunidade médica e acadêmica, até os não iniciados no assunto que tiverem curiosidade pelos tópicos de saúde global e antropologia. Os capítulos trazem diversos relatos de personagens locais e se aprofundam nas expressões culturais de diferentes regiões, com foco na Indonésia, onde os autores dos textos concentraram seus estudos.

Para a professora Profa. Maria de Lourdes Beldi Alcântara, a importância desta tradução reside na perspectiva mais ampla que ela traz da antropologia médica, já que a educação biomédica atual, inclusive no Brasil, resulta em uma visão dissociada entre o paciente e o mundo em que ele vive. “Se não mudarmos esta visão, a antropologia e outras disciplinas sempre serão vistas como perfumaria para aqueles que enxergam o corpo como um sistema fechado nele mesmo e esquecem o meio ambiente e as relações socioculturais.”